Em busca de afinação

Quando o Remo se preparava ainda para o Brasileiro da Série C, o anúncio da contratação do veterano Zé Carlos fez muito torcedor tremer na base. O aval do técnico Mazola Junior deu a impressão de que o time podia reviver, com as mesmas angústias, a experiência de 2019, quando o também rodado Neto Baiano passou em brancas nuvens pelo Evandro Almeida.

A diretoria atendeu o técnico e trouxe Zé Carlos em declarada aposta de alto risco, mas seguiu procurando um atacante mais jovem, capaz de responder bem aos desafios de outras funções ofensivas.

Tcharlles foi o nome que passou a ser especulado. Estava na disputa do Campeonato Paulista, defendendo a Inter de Limeira. Marcou um gol apenas na fase de confronto com os grandes clubes e esse retrospecto passou a ser brandido contra sua contratação.

Mesmo com a informação de que não era um centroavante clássico, muita gente se posicionou contra a vinda do jogador. A reação, de certa forma, não surpreende. Faz tempo que o Remo não acerta a mão na busca por um artilheiro. As dificuldades fazem com que a torcida frequentemente relembre nomes como Robinho, Alex Dias e até Luciano Viana.

Aliás, o bonito gol de Tcharlles contra o Castanhal na quinta-feira à noite remeteu aos tempos de Viana, um exímio finalizador da entrada da área e que tinha facilidade para chutes de curva e gols por cobertura.

A essa altura, já com presença assegurada na decisão do Campeonato Estadual e depois de duas atuações elogiadas de Tcharlles, o ataque remista começa a ser reavaliado. Parece que chegou a solução para a dificuldade inicial do esquema, que sofria com o isolamento de Zé Carlos e a solidão de Eduardo Ramos na faixa mais adiantada.


É cedo para decretar que Tcharlles vai resolver todos os problemas e curar todos os males acumulados do setor ofensivo, mas é legítimo acreditar que a presença dele rejuvenesce as ações pelos lados e garante a presença de um finalizador para se revezar com ER.

Para quem imaginava que a Série C tendia a apresentar um Remo sólido na marcação, mas previsível e lento na frente, a chegada de Tcharlles representa um inegável sopro de esperança.

Agonia e morte de uma requintada arte brasileira

Zico, Rivellino, Nelinho, Dicá, Jorge Mendonça, Pita, Neto, Mendonça, Branco, Zenon, Djalminha, Marcelinho Carioca, Juninho Pernambucano, Ronaldinho Gaúcho. O país que produziu alguns dos maiores chutadores do futebol em todos os tempos de repente percebe que os gols de falta estão cada vez mais escassos.

Não por coincidência, todos os citados não jogam mais. Os jogadores em atividade não chegam nem perto da média de gols dos especialistas do passado. As faltas continuam a acontecer, até com mais frequência, mas não há gente capaz de aproveitar e transformar em vantagem.

Um gol do volante Felipe Bastos, do Vasco, contra o Sport-PE chamou atenção porque foi um dos primeiros do Campeonato Brasileiro em cobrança de falta. Por raro, mereceu até matéria na televisão. Bastos não tem a técnica refinada dos antigos cobradores e não costuma fazer gols.

A realidade é que, por uma série de motivos, o futebol brasileiro perdeu uma de suas armas mais letais. É difícil ver uma cobrança bem executada, daquelas que entram na forquilha, sem chances para o goleiro.

Muita coisa contribui para os números quase inexpressivos de gols de falta no Brasil de hoje. Um exemplo: o Flamengo, considerado o melhor time do país, não faz gol em cobrança de falta há dois anos.

A jogada era quase uma marca brasileira, um recurso de habilidade e pontaria que permitia decidir jogos difíceis. O time às vezes não atuava bem no aspecto coletivo e aí aparecia o camisa 10 para resolver o problema com um tubo no ângulo, lá onde a coruja dorme.

A precarização que assola o setor de meia-cancha, território onde maestros desfilavam no passado e hoje qualquer botinudo tem vez, é o principal motivo da crise. Temos menos jogadores de talento para bater na bola.

Bons cobradores precisam de pontaria, manha, talento e precisão absoluta. No passado, jogadores como Zico dedicavam horas ao treinamento de cobranças. Reza a lenda que o Galinho usava uma toalha como referência para encaixar a bola fora do alcance dos goleiros.

Mesmo que atletas de características e posições diferentes também se destacassem como bons batedores – como os laterais Marinho Chagas, Nelinho, Branco e Roberto Carlos –, é fato que os armadores sempre dominaram o fundamento.

Outro ponto que afetou o surgimento de grandes cobradores é a orientação dos fisiologistas contra treinos repetitivos – como os de Zico no passado. Há a evidência de que movimentos de alta intensidade forçam a musculatura das pernas e joelhos podendo provocar lesões graves, tão comuns em esportes como o vôlei.

Analistas destacam a evolução técnica dos goleiros, mais ágeis e de maior porte – altura média hoje em torno de 1,90 contra 1,75 nos anos 70/80. É um fator a considerar, mas o talento natural continua acima de todos os demais itens determinantes para êxito no fundamento. Os craques sempre sabem bater muito bem na bola.

Bola na Torre

Guilherme Guerreiro no comando, com participações de Giuseppe Tommaso e deste escriba baionense, a partir das 22h30. Em pauta, as finais do Parazão e a rodada da Série C.

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