Nos 403 anos, Belém tem características próprias que a definem. Assim como outras metrópoles num país que respira futebol, a rivalidade entre Paysandu e Clube do Remo divide os moradores da capital desde o nascimento. Em lados equânimes, bicolores e azulinos dividem a paixão do belenense. E não são raros os casos de jogadores e outros profissionais da bola que vêm a Belém e por aqui fixam residência. O que os atrai para permanecerem numa cidade que, em média, tem os mesmos problemas e atrativos das demais de mesmo porte no Brasil?

Via de regra, mais até do que os pontos turísticos e a comida, a relação com o povo é mais lembrada pelos belenenses de adoção. A forma de acolhimento e o reconhecimento faz com que muitos escolham permanecer por aqui mesmo após pendurar as chuteiras. Um dos casos mais emblemáticos é o de Vandick Lima. Baiano de Conceição do Coité, o ex-centroavante bicolor abandonou os gramados em 2003, logo após o fim da histórica participação do Papão na Libertadores da América. A identificação com a cidade foi tanta que ele engatou três mandatos consecutivos de vereador, chegando a ser presidente do clube de coração.

“Belém foi a cidade com a qual mais me identifiquei. Foi muito intenso aqui, vivi coisas boas e ruins. Quando parei de jogar já estava bem ambientado, minha mulher adora a cidade, minha filha tem as amigas delas, sempre fui muito bem tratado e isso cativa. Logo depois fui eleito vereador e fiquei três mandatos”, explica Vandick, hoje com 53 anos.

Com a mesma idade, o sergipano Agnaldo de Jesus chegou a Belém uma década antes de Vandick. Embora também tenha sido campeão paraense pelo Paysandu, é o Baenão que ele chama de casa. Multicampeão pelo Leão Azul como jogador, como técnico esteve à frente do mítico título com 100% de aproveitamento em 2004. Segundo o atual treinador do Bragantino, sair de Belém é algo que não passa pela cabeça.

“O povo me motivou a ficar aqui. O paraense é diferenciado em tudo, cordialidade, carinho, esse lado humano. Morei em vários estados, em várias cidades e não é assim, não tem esse algo a mais de Belém. Minha identificação foi muito rápida. Muitos jogadores de fora vieram e ficaram. Costumo dizer que é uma química de atração com o pessoal daqui”, disse. “Tinha opção para voltar a Sergipe ou ir a Recife, onde fui campeão pelo Sport. Mas optei por ficar no Pará”, completou o “Seu Boneco”, apelido de quando atuava dentro das quatro linhas.

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Lugares que ficam marcados no coração


O ídolo Vandick adotou Belém após pendurar as chuteiras (Foto: Irene Almeida)

Quem está no meio do futebol profissional tem pouco tempo para sair, para aproveitar as cidades. Brigatti salienta a paixão local pelo futebol e pela fé para apontar um de seus locais preferidos em Belém. “O povo é fanático por futebol, é muito religioso. Estou sempre na Basílica, sempre muito bem recebido”.

A preferência pelo local é a mesma de Diogo Sodré, que espera a chegada dos parentes para apresentá-los a uma das principais igrejas da capital. “Como sou uma pessoa de muita fé, sem dúvida a igreja de Nazaré com sua história e os detalhes. Realmente é um lugar de paz e bonito de conhecer. Quando minha mãe, irmão, sogra e sogro vierem vai ser o primeiro lugar que levarei eles, com certeza”.

O jogador revela que recebeu dicas de um velho conhecido da torcida remista para conhecer melhor Belém. “Já havia ouvido falar de todos os lugares, pois tenho amigos que jogaram aqui, como o Maico Gaúcho. Ele me deu umas dicas sobre a cidade. Quero conhecer a Ilha do Marajó quando tiver uma oportunidade boa, além de outros lugares bons que têm aqui”.

Para Agnaldo, a maior feira livre da América Latina divide com o Baenão como um dos locais no qual mais se sente bem quando sai de casa. “Gosto muito de ir ao Ver-o-Peso, seja para comprar as coisas da terra, comer ou ficar no meio do povo. Toda semana estou lá e me sinto em casa. É um local do povo e sou do povo. Me sinto muito bem, lembro de quando ia à feira com minha mãe”.

Já Vandick deixa claro que não abre concessão. O ex-centroavante e ex-presidente do Paysandu frequenta constantemente sua segunda casa. “O lugar de Belém que mais gosto de ir é na Curuzu ver os jogos do Papão. Mas tem muitos lugares bons. Gosto da Estação das Docas, do Portal da Amazônia, de ir comer no Ver-o-Peso. Tem muitas coisas boas aqui”, comenta.

Eles foram fisgados pela culinária paraense

Filhote, prato preferido de Diogo Sodré (Foto: Arquivo Pessoal)

Logo que chegou a Belém, o meia Diogo Sodré usou as redes sociais para dar suas primeiras impressões sobre Belém. Nas fotos compartilhadas em redes sociais, nada de selfies ou pontos turísticos, e sim comida e mais comida. Motivo de adaptação demorada ou não para muita gente que chega por essas bandas, a culinária local acertou em cheio o coração – e o estômago – do jogador paulista de 27 anos. Junto com a esposa, Diogo tem desbravado de restaurantes a churrasquinhos, sempre com o desafio de provar as iguarias e manter a forma de atleta profissional. “Acho que todo mundo ouve falar desde pequeno da culinária brasileira e com destaque a paraense. O Pará é rico em frutos, produções alimentícias. Estou feliz de estar de perto e comendo todas as receitas culinárias. Mas com calma né? Se não, logo não consigo treinar de barriga cheia”, diz o jogador, que revela as preferências.

“Eu e minha mulher gostamos muito de cozinhar e conhecer restaurantes novos. Eu já experimentei tacacá, vatapá, sucos. Os melhores, na minha opinião, taperebá e pitaia. Gosto muito também de pupunha cozida com café”, afirma. “Um amigo levou a gente num churrasquinho e sempre que posso vou. No churrasquinho, sento na mesa da calçada e como à vontade, recomendo. Mas o prato que me chamou atenção aqui e toda vez eu peço é o risoto com jambu, queijo do Marajó, acompanhado de filhote com castanha em cima. Esse sem dúvida é uns dos melhores pratos que comi na minha vida”.

Brigatti e sua família já estão adaptados à cidade. (Foto: Arquivo Pessoal)

O técnico paulista João Brigatti, 54, revela que estranha um pouco a quase onipresença de um tempero particular nos pratos paraenses. Mas que na sua terceira passagem pela Curuzu, já elegeu o prato preferido entre tantos que gosta. “Estranho um pouco o tempero, em particular o coentro, que não gosto. No restante gosto de tudo, a culinária é muito boa. Gosto de tacacá, de filhote, que é um peixe que não encontro em lugar nenhum. Eu me adaptei e tem pratos maravilhosos aqui”. Já Vandick garante que a relação com a comida local teve um peso grande na sua permanência. “Acho a culinária daqui me ajudou demais na adaptação. A comida daqui é muito gostosa, tem muito tempero como na Bahia. Além disso, o povo é alegre como o baiano. Essas coisas me cativaram e me sinto bem aqui, por isso estou até hoje em Belém”, conta.

E MAIS…

POR UMA CIDADE MELHOR!

– No aniversário do ano passado, Belém foi avaliada como tendo a região metropolitana com a pior qualidade de vida do país, de acordo com dados do Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU). Saneamento, acessibilidade, meio-ambiente foram algumas das carências apontadas. Para os filhos adotivos da cidade paraense, o caminho de uma melhora passa por uma atenção diferenciada dos que estão em sua administração.

– “Tem que melhorar na saúde e de segurança. Essas coisas têm que melhorar muito e ouvimos tantos relatos complicados. Desejo que em breve Belém melhore nesse sentido e o povo de Belém possa ficar mais tranquilo”, afirma Vandick Lima.

– Neto de um paraense, Agnaldo ponta o paradoxo do estado ser rico em recursos e pobre em desenvolvimento humano como algo que não se pode aceitar. “Tem que começar pelos governantes, que olhem mais para o povo e deixem de pensar no proveito próprio. Isso que faz com que Belém e o Pará estejam abandonados. Um estado riquíssimo como o nosso não pode estar assim. Tem que melhorar em todos os sentidos”.

– João Brigatti salienta a falta de vontade política como algo comum em todo o território nacional. “Os problemas são iguais aos de todo o Brasil. Os governantes poderiam olhar com mais carinho para os problemas da cidade”.

(Tylon Maués/Diário do Pará)

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