Gustavo Scarpa tinha bons motivos para deixar o Palmeiras em agosto de 2020. Artilheiro da equipe no ano anterior, com 13 gols, o meia havia participado de somente dois jogos como titular dos 22 disputados até ali na temporada, já parcialmente comprometida pela pandemia da Covid-19.
Afastado em janeiro por conta de uma negociação com o Almería – que acabou frustrada-, vivia em desprestígio com o então técnico Vanderlei Luxemburgo quando recebeu uma nova proposta, do Atlético-MG.
A solução parecia animadora: trocar o Palmeiras pelo líder do Campeonato Brasileiro na ocasião e praticamente dobrar o salário.
Scarpa preferiu o improvável: tentar se reerguer no próprio clube.
Conhecido por uma coletânea de hábitos pouco comuns no meio do futebol -skate, wakeboard, cubo mágico e literatura-, tomou uma decisão fora da curva que o levou a dar a volta por cima no Palmeiras.
Pouco mais de dois anos depois, ele ergue a última das oito taças conquistadas no clube -a quinta depois da proposta rejeitada.
Acertado com o Nottingham Forest para disputar o Campeonato Inglês a partir de janeiro, tem uma despedida bem diferente da que poderia ter acontecido anos antes: com redenção consolidada e como protagonista.
Scarpa virou peça fundamental desde a chegada de Abel Ferreira, em outubro de 2020. Não são raras as trocas abertas de elogios entre o treinador português e o pupilo. O atleta enaltece, principalmente, a clareza tática e a forma como o chefe o fez enxergar o jogo.
Com Abel, Scarpa chegou a atuar até mesmo na lateral esquerda, com direito a um apelo incomum do treinador para Tite. “O que quero dizer é que, se Tite me ouvir, e é bom que ouça, ele é muito bom nessa posição”, disse o português, em novembro de 2020, um mês após sua chegada.
De quebra-galho eficiente na lateral, virou absoluto do lado direito na linha mais ofensiva da equipe e, mais recentemente, principal cabeça pensante após a saída de Raphael Veiga da equipe, por lesão.
Só não teve participação direta em gols em dois dos últimos dez jogos. Dos 20 gols marcados no período, fez três e ainda distribuiu seis assistências para os companheiros.
Segundo o site de estatísticas SofaScore, Scarpa ainda é o líder geral de assistências da competição, ao lado de Arrascaeta, com participação em dez gols. Marcou, contudo, seis gols no Brasileiro, contra apenas três do meia do Flamengo.
O jogador também é quem mais acerta cruzamentos e passes decisivos e quem mais arrisca chutes de fora de área.
“Eu acredito que amadureci muito, tanto naturalmente pela idade, quanto pelas experiências que tenho vivido no Palmeiras. Tenho desempenhado funções mais defensivas pela equipe, que é o mais importante. Acredito que evoluí muito como jogador “, analisou após a partida contra o Cuiabá, em julho.
A própria chegada ao clube paulista, em 2018, foi uma das barreiras mais duras. Ele ficou três meses sem poder atuar devido a uma longa batalha judicial.
Na época, Scarpa ingressou com uma ação para se desvincular do Fluminense, apontando uma série de pagamentos atrasados, e acertou o contrato de cinco anos com o Palmeiras. Para pôr fim no imbróglio, precisou abriu mão de valores e convencer o novo clube ao pagamento de quase R$ 24 milhões à antiga equipe.
A relação foi além da volta por cima em campo. Scarpa incorporou a alma palmeirense. Viralizou nas redes sociais um vídeo do jogador sofrendo ao acompanhar a disputa de pênaltis vencida pela equipe diante do Atlético-MG, pelas quartas de final da Libertadores. Expulso, assistiu ao desempate em uma TV no vestiário.
Com mais de 50 assistências pelo Palmeiras, oito títulos e o dever cumprido, Scarpa, agora sim, está pronto para dizer adeus. Em seus termos.
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