Tão longe, tão perto

Com Pelé, a gente foi feliz e não sabia. Vivemos uma era em que, apesar das distâncias e da comunicação precária, os ídolos eram mais acessíveis. Talvez até porque o conceito de idolatria ainda estava em construção. Os próprios ídolos não sabiam de seu poder e magnetismo. E, claro, não havia ainda o arsenal de ferramentas de marketing para monetizar as emoções.

São reflexões que normalmente faço sobre a complexa relação entre os craques de futebol e torcida. Nos anos 1950 e 1960, auge da majestade de Pelé no planeta bola, o torcedor não tinha o fanatismo que marca as reações atuais. Os excessos não existiam. Os jogadores conviviam pacificamente, apesar da fama, com o cidadão comum.

Eram tempos que permitiam a um astro da magnitude de Pelé sair tranquilamente à rua em Santos ou qualquer outra cidade. Desfrutava da paz que cerca as pessoas normais. A sociedade midiática que conhecemos ainda levaria décadas para nascer e transformar tudo em superposição de imagens, nem sempre verdadeiras.

Situação oposta aos dias atuais, quando é inimaginável ter contato direto com superastros, como Messi e Cristiano Ronaldo, verdadeiras marcas ambulantes, cercadas de cuidados e rigorosos aparatos de segurança.

Quando esteve em Belém pela primeira vez, já famoso mundialmente pelas diabruras que aprontava ao lado de Coutinho, goleando qualquer time que se pusesse à sua frente, os relatos descrevem um cara que papeava no hall do hotel e não se furtava a um autógrafo.


Era 1965, os Beatles já enlouqueciam fãs do rock mundo afora, mas o futebol tinha suas leis e uma etiqueta que permitia a adoração não invasiva. Eram gestos encabulados, de quem quer chegar junto sem incomodar.

Naquelas turnês que cortavam o Brasil de ponta a ponta, Pelé veio parar em Belém. Abril de 1965. Amistoso noturno num Evandro Almeida socado de gente. O Rei não negou fogo. Fez cinco dos gols da surra de 9 a 4 que o Peixe desfechou sobre um aguerrido Remo.

Antes do prélio, vestiu a camisa azulina e entrou no gramado tributando o dono da casa, para delírio da massa que se acotovelava nas arquibancadas. O torcedor parecia não acreditar: o Rei do futebol vestindo a camiseta azul-marinho ao lado dos companheiros trajados com o alvo manto peixeiro.

Pelé retribuía a gentileza da diretoria remista, que lhe entregou um ramo de flores e uma placa alusiva à visita. Em campo, feito um azougue, ele expôs os motivos de ser reverenciado como o maior jogador da época, bicampeão mundial interclubes e bicampeão mundial com a Seleção.

O Remo foi, como todos os sparrings do Santos de então, um coadjuvante na partida. Os gols que iam saindo aos borbotões não entristeciam a torcida. Muito pelo contrário, cada gol de Pelé era aplaudido freneticamente. Havia a plena consciência de uma noite especial e única.

A felicidade de estar presenciando uma atuação de gala do Rei produziu um milagre: fez com que, pela primeira e última vez, o torcedor azulino vibrar com gols marcados contra o próprio time do coração.

O mesmo enlevo se repetiu em 1968, na Curuzu, mas o Rei desta feita foi mais econômico. Fez apenas um gol na vitória de 3 a 1 sobre o Papão de Quarenta, embora a apresentação tenha sido igualmente aplaudida pela galera, indiferente à derrota alviceleste.

Era moleque, morava em Baião ainda, por isso não acompanhei a passagem do Rei por aqui. Mas, pelo testemunho de amigos (como Edyr Augusto) que estavam lá, é possível reavivar memórias tão ricas, dos tempos em que um timaço de futebol dava espetáculo generosamente em cada cidade visitada. Os 80 anos do Rei merecem todas as reverências possíveis.

Enfim, o Baixinho marca um golaço como senador

Romário (Pode-RJ) apresentou esta semana um projeto de lei para impedir que o sistema desportivo do Brasil puna atletas que se manifestem politicamente. A iniciativa tem a ver com a advertência que o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) aplicou em Carol Solberg por dizer “Fora, Bolsonaro” em entrevista após uma partida de vôlei de praia. Não deixa de ser um gesto surpreendente. Romário, ao contrário do craque inquieto dos gramados, é um político de posições conservadoras.

Mas, a essa altura, o que importa é que a proposta acrescenta um artigo libertário à Lei Pelé: “Nenhum atleta poderá ser punido com as penalidades previstas neste artigo ou enquadrado em qualquer infração disciplinar devido a uma manifestação de natureza política, salvo se houver ofensa direta e expressa, durante a disputa de uma competição, a um de seus participantes, patrocinadores ou organizadores”

Pelo projeto, nenhum regulamento, como o do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, manejado para punir Carol, pode ser arguido para impedir o exercício de um direito constitucional. “Qualquer mácula ou obstáculo que se oponha de maneira injustificada e absoluta, seja sob a forma de contrato ou por regulamento esportivo vinculante entre as partes, é nula de pleno direito, por ferir de maneira frontal um direito fundamental indisponível e impossível de ser transacionado”, diz a proposição, protocolada sob o número 5004/2020. Sem dúvida, um golaço do Baixinho.

Bola na Torre

Guilherme Guerreiro comanda o programa, a partir das 22h, na RBATV. Em destaque, os jogos da dupla Re-Pa na Série C. Participações de Valmir Rodrigues e deste escriba baionense. Direção de Toninho Costa.

Falcão marca presença em Belém e dá treino funcional

Com a esperada presença de desportistas, personalidades e artistas paraenses, o craque Falcão participa nesta terça-feira (27), às 19h, da inauguração da Arena Belém, licenciada da marca do “Rei das Quadras”. O evento terá também um treino funcional, criado pelo maior jogador de futsal de todos os tempos. A arena Belém contará com duas atividades licenciadas pelo ex-jogador: uma escolinha de futsal e outra de society para crianças, nas categorias masculino e feminino, de 6 a 17 anos.

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